Marco Antônio Pontes | Equívocos dos que só pensam ‘naquilo’

Comunicação & Problemas

 

Tributo a Octavio Malta (Última Hora, Rio, circa 1960)

 Marco Antônio Pontes

([email protected])

 

De novo!

Até quando acerta o governo Temer erra e…

Mal iniciei a frase parei, dei-me um tempo ante a impressão de que me repetia e constatei: de fato começara assim uma coluna.

Então percebi que o fizera mais de uma vez, enfim descobri que se repete não o colunista porém o governo, que acumula erros mesmo se faz a coisa certa – a melhor dizer, quando age conforme seus objetivos e interesses.

Forma equivocada

Retomo, pois, a crítica: a decisão de intervir na segurança pública do Rio, de prometer aos fluminenses efetivo combate ao crime e resgate do caos a que os condenaram a imprevidência e incompetência de sucessivos governos locais e nacionais, serve aos propósitos do Planalto; a forma de implementá-la, porém, embute equívocos capazes de comprometer a obtenção dos objetivos e embaçar a imagem que se quer lustrar.

Excesso de zelo

O Planalto exagerou a necessária reserva na gestação da iniciativa ao excluir do processo os presidentes do Senado e da Câmara – sobretudo o deputado Rodrigo Maia, eleito pelo Rio e filho de César Maia, político com sólidas bases no estado e um dos poucos à margem do lamaçal em que afundaram os líderes fluminenses.

Faltou combinar

Ademais a surpreendente medida, a primeira desta natureza na vigência da Constituição de 1988 e raros antecedentes na história – só me lembro da deposição do governador de Goiás, Mauro Borges Teixeira, nos anos 1960 e em circunstâncias muito diversas, sob a então nascente ditadura – não se precedeu de formulações quanto a seus desdobramentos, uma estratégia mesmo preliminar para desencadear as ações.

Tampouco combinou com as Forças Armadas seu papel no processo, gerando constrangimentos. Por isso o general Valter Braga Neto, que liderará a intervenção, esteve tão pouco à vontade na solenidade em que o governo deflagrou-a.

Plano apressado

Grotesco, imperdoável foi o ‘drible a mais’ que reduziu, em vez de incrementar a repercussão favorável que o governo esperava, inclusive para deixar em segundo plano a derrota na reforma a Previdência Social.

A tentativa de cortejar o mercado com medidas legislativas de fins alegadamente coincidentes, sem combinar com os presidentes do Senado e da Câmara, motivou já na partida ásperas respostas de ambos.

Dificilmente dará certo, o apressado ‘plano b’.

Só pensam ‘naquilo’

Claro está que tudo isso é parte dos jogos preliminares das eleições do próximo outubro. O presidente Temer quer capitalizar-se para ao menos influir, quem sabe protagonizar uma candidatura do Mdb ao Palácio do Planalto, Rodrigo Maia articula apoios com análogo objetivo, aos poucos a rivalidade fala mais alto que os interesses comuns. E, claro, como todos os demais políticos eles ‘só pensam naquilo’ – eleição.

Era nada disso…

Pensemos, então, ‘naquilo’. Na coluna Brasília-Df (Correio Braziliense, 10.02) Denise Rothenburgh levanta uma hipótese interessante.

Segundo suas fontes – pessoas ligadas a Fernando Henrique que participaram da recente conversa em que o grão-tucano estimulou uma eventual candidatura de Luciano Hulk –, a ideia seria lançar o apresentador global não à Presidência da República mas ao governo do Rio, pelo Psdb.

Parece razoável, mas caberia perguntar: por quê? Fernando Henrique não diz claramente o que pretende?

Oportunismo?

A colunista mal insinua a pergunta e deixa-a no ar. Como se a respondesse, César Fonseca sugere explicação surpreendente:

o ex-presidente seria deliberadamente ambíguo, quereria inviabilizar candidatos entre os correligionários para que restasse só um – ele; teria afinal encontrado a oportunidade com que sonha desde que deixou o Planalto.

Recomendo o artigo, está no site Independência Sul-Americana.

Renovação ‘espiritual’

Avaliem os leitores se não faz sentido. O tucanato divide-se até na disputa pelo ‘sacrossanto’ (lá, deles) governo paulista, Alkmin não decola nas pesquisas, o chamado centro político desespera-se na busca de presidenciável competitivo, a sucessão volta à estaca zero com a inviabilização de Lula… Assim a renovação política pregada por Fernando Henrique dar-se-ia com ele mesmo, “que se julga espiritualmente jovem” – anota Fonseca.

Informação sonegada,…

E por falar em sondagens pré-eleitorais, a imprensa sonega informação preciosa obtida nas pesquisas ditas ‘espontâneas’, nas quais se pergunta ao eleitor algo assim: “Já escolheu candidato(a) a presidente da República? Caso tenha escolhido, em quem vai votar?”

Só mostra, a mídia, o resultado ‘estimulado’, que resulta da apresentação de lista com os possíveis candidatos – a esta altura óbvia indução a escolhas precipitadas.

…avaliação prejudicada

Ao lado dos índices de rejeição, também menosprezados nos noticiários, as respostas ‘espontâneas’ são decisivas para avaliar a predisposição do eleitorado sobretudo nas fases iniciais de campanha, em que candidaturas têm muito de especulação.

Por exemplo, na última sondagem Datafolha o pouco que consegui desses dados indica que os autodeclarados candidatos Lula e Bolsonaro teriam ‘espontaneamente’ menos que a metade das intenções ‘estimuladas’ de voto e reduzir-se-ia mais que proporcionalmente a distância que os separa de outros postulantes – Marina, Ciro, Alkmin…

Aposta perdida

Já apostei em José Eduardo Cardozo como um dos refundadores do Pt; mais que isto, da (re?)criação de um partido realmente progressista no imprevisível cenário da esquerda pós-Lula, a que emergirá da debacle petista. Mas sua entrevista a Miriam Leitão (GloboNews, 15.02) revela que em vez de partícipe da construção do futuro ele continua defensor do que já passou – hoje de Lula, dos crimes por que a Justiça o condena, como antes – e antes mesmo de deixar com ela o governo para representá-la formalmente – tentou isentar Dilma dos que resultaram no impeachment.

Distorções, mentira

Cardozo descredenciou-se ao fingir admitir erros (crimes?, nem pensar) do Pt e desdizer-se ao remetê-los a um conjunto impreciso “de equívocos da política brasileira” – o velho vezo de justificar-se com os erros alheios.

Pior que distorcer, mentiu ao negar evidência atual e histórica: para ele o Pt não apoia nem apoiou o grotesco Maduro, projeto de ditador da Venezuela.

Pautas esdrúxulas, obscenas

Uma querida amiga vê com reservas a ideia de convocar-se assembleia constituinte (escreveu-me particularmente, por isso não lhe digo o nome). Após citar anedota que leu no Facebook (“Depois de sediarmos a Copa, as Olimpíadas, nos preparamos para sediar a Idade Média”), ela adverte:

– Meu grande medo […] é de que essa direita fundamentalista e barulhenta consiga incluir na constituinte todas as pautas esdrúxulas e obscenas […] que desrespeitam a convivência sadia, em que ideias e pontos de vista divergentes sejam acolhidos e respeitados.

Fundamentalista e barulhenta

De fato haveria tal risco numa eventual constituinte. Entretanto a pauta perversa apontada pela amiga, mais que ameaçar, já nos vitima justo agora.

A “direita fundamentalista e barulhenta”, a representada no governo e a que tenta assaltar o estado, já impõe ensino religioso nas escolas públicas enquanto retira questões de gênero e análogas da base nacional curricular; por pouco (vá a caricatura) não revogou a Lei Áurea; vale-se dos influxos da anomalia intelectual e moral que assumiu o poder nos Eua para promover retrocessos nas questões que envolvem o meio ambiente, os índios…; houve até um juiz que tentou obrigar psicólogos a ‘curar’ (!) homossexuais…

Assembleia ‘vacinada’

Por isso inclino-me à talvez utópica ideia de constituinte exclusiva, nos termos em que a propuseram os juristas citados com maestria pelo jornalista Ruy Fabiano e reproduzi aqui.

Seria exclusiva porque seus membros reescreveriam a Constituição e nada mais, não se confundiriam com o Congresso nem a ele aspirariam em legislatura subsequente, entre outras peculiaridades. Assim poderia atrair gente disposta a pensar o Brasil sem interesses outros, nem mesmo os legítimos, quanto mais os subalternos.

O que poderia ‘vacinar’ a assembleia contra as pautas esdrúxulas e obscenas”.

Seja o primeiro a comentar on "Marco Antônio Pontes | Equívocos dos que só pensam ‘naquilo’"

Faça um Comentário

Seu endereço de email não será mostrado.


*