Marco Antônio Pontes | Imprensa relapsa, Brasil contrastante

 

 

 

 

Tributo a Octavio Malta (Última Hora, Rio, circa 1960)
Marco Antônio Pontes – [email protected]


Imprensa relapsa

A grande imprensa ‘comeu mosca’ durante meses, não percebeu o óbvio até que foi alertada em carta do leitor de Veja (edição de 26.07) Milton Córdova Júnior – cito-lhe o essencial:

“Em 07.12.2016 o Stf decidiu na Adpf 402 que a Constituição proíbe réus de estarem na linha sucessória da Presidência da República. Ora, […] onde existe a mesma razão fundamental, prevalece a mesma regra de direito. Lula é réu em cinco processos – já estando condenado num deles. Portanto […] estará inelegível, sendo desnecessária uma condenação em segunda instância […].

Finalmente!

Só então a circunstância foi descoberta pela imprensa. Primeiro por um colunista da Folha de S. Paulo, a qual em seguida publicou carta de leitor a cobrar atenção e expressar igual entendimento – e assim o assunto ganhou o mundo da mídia.

Certamente estarão em alerta também os advogados dos partidos que se opõem ao Pt, além de juristas não engajados que, a bem da higidez político-eleitoral, desejarão exorcismar a absurda pretensão de Lula e seu partido.

Recurso extraordinário

Enquanto não é hora de arguir-se, nos tribunais eleitorais, a inelegibilidade do senhor Luís Inácio, convém aos doutos desembargadores federais do Tribunal da 4ª Região atentar para as especificidades do recurso que têm em mãos, o interposto contra a condenação do ex-presidente.

Os primeiros sinais de Porto Alegre são preocupantes, como me dei conta há duas semanas quando seu presidente estimou em um ano (doze meses!, 365 dias!!) o tempo necessário para decidir a questão.

E pouco depois um dos três juízes da Turma que julgará o caso declarou que o processo de Lula será tratado como qualquer outro.

Insanidade anunciada

Perdão!, Excelência, este não é um processo como outro qualquer. Entendo que o douto juiz haja-se referido à isenção com que tratará o caso, o que é louvável. Quanto a tudo mais – e ao que mais interessa — porém, a decisão que se espera tem a ver com a sanidade das eleições de 2018: ou bem se decide em tempo hábil se o caudilho petista pode ou não ser candidato, ou a campanha que ele próprio já deflagrou (antes da hora, a acrescer ilegalidade) transformar-se-á numa pendenga jurídica, com enorme prejuízo da discussão dos grandes temas nacionais que deveria informar a escolha do próximo presidente da República.

Compromisso com a história

As circunstâncias recomendam aos ilustres membros daquele Tribunal enfrentar o caso como algo excepcional – não quanto aos aspectos jurídicos, os quais considerarão tecnicamente como sempre, porém no que respeita às repercussões de seu desempenho; no caso, é o tempo que urge e ruge em seu entorno: deixar que a campanha se fira sob tamanha incerteza, talvez que as eleições ocorram sub judice será omissão da qual a história não os absolverá.

O menos e o mais

Não costuma este provecto, humílimo escriba regozijar-se de eventuais acertos. No caso, porém, mesmo muito humilde embora pouco modesto (contradição nenhuma), permito-me lembrar aos leitores que mais de uma vez comentei aqui a antecipada inelegibilidade de Lula, desde que o Stf decidiu da Adpf referida na primeira nota desta coluna (a propósito: ao que me consta, a sigla meio cabalística significa ‘Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental’).

Sem o conhecimento jurídico do leitor de Veja supra citado, sintetizei minha impressão numa paródia de um dito popular: quem não pode o menos, não pode o mais.

Contraste redentor

Ainda bem que neste Brasil tão vilipendiado por corruptos e incompetentes alçados a elevadas posições no estado, empresas, corporações…, restem exemplos de honestidade, decência, desprendimento, solidariedade. Como o relatado na crônica de Marcelo Alcoforado, que diz a que vem já no título: Um Brasil contrastante. Ainda bem.

Não vou contar a história, não o faria com a verve do cronista (guardo o texto para retransmitir a quem pedir). Adianto apenas que ele encontrou, bem diferente dos “saqueadores empanturrados de dinheiro” e “falsos salvadores da pátria, falsos honestos, falsos heróis que com sua impostura têm sugado o sangue dos brasileiros”, um humilde mecânico cearense cuja solidariedade nos alenta e redime.

É gente humilde

Não foi o episódio, em si, que me atraiu a atenção, embora o beau geste de José Ewerton comova-me – ainda mais se salvou a vida de um bebê de Medellín, Colômbia, a cujos cidadãos os brasileiros devemos enorme gratidão.

Temos assistido a iniciativas análogas, todas protagonizadas por gente simples do povo pobre como constata Alcoforado, aquela mesma gente cantada por Vinícius, Chico e Garoto: “E aí me dá uma inveja dessa gente,/ é gente humilde – que vontade de chorar!”.

Suave e severo

Encantou-me, na leitura, a lhaneza com que Alcoforado aborda os contrastes nestes estranhos tempos de Brasil.

O povo capaz de gestos de grandeza elege representantes “saqueadores”, não raro mediante troca de votos por botijões de gás, sinecuras no serviço público – sem contar que joga lixo na rua, infringe leis no trânsito, suborna policiais…

E suavemente (suavitur in modus, durus in rebus – ser suave no jeito, duro na ação, traduzo livremente para o caso) o cronista, enquanto resgata o melhor, denuncia o pior deste Brasil contraditório.

Ato falho

Aproveito que citei Marcelo Alcoforado para agradecer-lhe a correção de um lapso que cometi há duas semanas, quando escrevi que o presidente Bush (o filho) elogiara Lula:

– Lula é [foi] ‘o cara’ de Barack Obama – lembrou.

Ato falho, talvez, deste velho colunista, a descrer de que Obama cometesse tal equívoco.

Trump x Trump

Pra não dizer que passei outra semana sem falar (mal) de Trump registro que se deflagrou nos Estados Unidos inusitada polêmica sobre quem é mais idiota, o primogênito ou o varão caçula do atabalhoado presidente.

Tudo porque se revelaram gravações comprometedoras de Donald jr. em conluio com suposta autoridade russa que forneceria à turma de Daddy informações venenosas contra a rival Hillary Clinton, em plena campanha eleitoral.

É uma bomba de muitos megatons, conforme analistas da imprensa estadunidense, alguns já a antever iminente um processo de impeachment.

Torneio idiota

Resta saber se nesse torneio de idiotas os rebentos de Donald Trump conseguirão, somados, exibir estultice maior que a do pai.

É páreo duro.

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